Exmo. Senhor,

Por carta de 14 de Maio pp, dirigida à Senhora Comissária Margot Wallström, V. Exa. chama a atenção para o processo que conduziu à aprovação do projecto de co-incineração de resíduos perigosos em Portugal, referindo-se especialmente ao papel desempenhado pela Comissão Científica a que preside. Na mesma carta V. Exa. assinala o facto de o actual Governo português ter abandonado a projecto de co-incineração de resíduos perigosos aprovado pelo Governo anterior, apesar do parecer favorável da Comissão Científica e da própria OCDE, e apesar de os testes entretanto efectuados terem identificado emissões muito inferiores aos valores previstos na Directiva 2000/76/CE, com excepção do NOx resultante da actividade cimenteira. Por outro lado, V. Exa refere que o Governo português decidiu privilegiar soluções de primeira linha, ou seja, de incentivo à redução da produção de resíduos, o que implica a manutenção, por tempo indeterminado, duma situação de falta de tratamento adequado dos resíduos industriais perigosos em Portugal. Por fim, depois de ter assinalado que a Comissão Europeia tinha arquivado duas queixas que punham em causa o processo de co-incineração, coloca a questão de saber se à luz das normas comunitárias é lícito que um Governo dum Estado-Membro proíba, sem qualquer fundamentação objectiva, a actividade de co-incineração depois de ter sido experimentalmente comprovado que tal actividade respeita a directiva supra mencionada.

Após a análise da carta pelos meus serviços, tenho a comunicar o seguinte:

As queixas a que V. Exa se refere tinham por objecto o processo de avaliação de impacto do projecto de co-incineração de resíduos industriais perigosos em Portugal. Tendo analisado a tramitação do referido processo de avaliação de impacto, a Comissão Europeia concluiu que ele tinha respeitado as normas comunitárias aplicáveis na matéria, a saber, as da Directiva 85/337/CEE, de 27 de Junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente, e, no caso da unidade de Outão, igualmente da Directiva 92/43/CEE, de 21 de Maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens, pelo que decidiu proceder ao arquivamento das mencionadas queixas.

Questão diferente é a da escolha do processo de tratamento dos resíduos em causa. Com efeito, a legislação comunitária refere-se a diversas metodologias possíveis, como sejam a reutilização, a reciclagem ou a valorização energética, onde se inclui a co-incineração - v. artigo 3º da Directiva 75/442/CEE, de 15 de Julho de 1975, relativa aos resíduos, modificada pela Directiva 91/156/CEE. Cabe aos Estados-membros escolher os processos que considerem mais convenientes ao tratamento dos resíduos perigosos. No entanto, ainda de acordo com a legislação comunitária, os Estados-membros devem dar a prioridade à prevenção ou à redução da produção e da nocividade dos resíduos - v. artigo 3º da Directiva 75/442/CEE, de 15 de Julho de 1975, modificada pela Directiva 91/156/CEE - e, no caso dos óleos usados, à sua regeneração -v. artigo 3º da Directiva 757439/CEE, de 16 de Junho de 1975, relativa à eliminação dos óleos usados.

Decorre do exposto, que a Comissão não pode censurar um Estado-membro pelo facto de decidir não prosseguir um projecto de co-incineraçao de resíduos perigosos, mesmo que esse projecto respeite as normas comunitárias aplicáveis na matéria e, nomeadamente, as da Directiva 2000/76/CE, de 4 de Dezembro de 2000, relativa à incineração de resíduos. Por outro lado, ao dar prioridade a uma solução de primeira linha e ao incentivo à redução da produção de resíduos, o Governo português respeita a ordem de preferências estabelecida pela legislação comunitária.

Todavia, V. Exa assinala que o abandono do projecto de co-incineração implica a manutenção por tempo Indeterminado duma situação de tratamento não adequado dos resíduos em causa, os quais são actualmente depositados em mais de 1500 locais espalhados pelo país. Ora, nos termos do artigo 4º da Directiva 75/442/CEE, modificada pela Directiva 91/156/CEE, "Os Estados-membros tomarão as medidas necessárias para garantir que os resíduos sejam aproveitados ou eliminados sem por em perigo a saúde humana e sem utilizar processos ou métodos susceptíveis de agredir o ambiente... . Os Estados-membros tomarão as medidas necessárias para proibir o abandono, a descarga e a eliminação não controlado de resíduos". Por sua vez, de acordo com o artigo 2º da Directiva 91/689/CEE, "Os Estados-membros tomarão as medidas necessárias para exigir que, em todos os locais em que se efectue o depósito (descarga) de resíduos perigosos, esses resíduos sejam recenseados e identificados".

Assim sendo, devo comunicar a V. Exa. que os serviços da Comissão irão chamar a atenção das autoridades portuguesas para a situação e requerer os respectivos comentários sobre a mesma.

Entretanto, solicito a V. Exa. que me comunique se deseja que a carta de 14 de Maio pp seja registada como queixa pela Comissão, me transmita, se disponíveis, informações mais precisas relativamente aos tipos, volume, forma actual de tratamento e destino dos resíduos industriais perigosos em Portugal e me informe se os locais onde os resíduos perigosos são depositados estão ou não licenciados pelas autoridades nacionais competentes.

Sem outro assunto de momento, queira aceitar os meus melhores cumprimentos,

G. Kremlis
Chefe de Unidade