Despacho nº 10 128/MAOT/2001 (2ª série)

 

Considerando que o processo de implementação da co-incineração como forma de eliminação de resíduos industriais perigosos se tem prolongado no tempo, adiando sucessivamente a resolução de um dos mais graves problemas ambientais do nosso País e que consiste na ausência de tratamento adequado deste tipo de resíduos e na proliferação de lixeiras e locais contaminados onde são depositados clandestinamente toda a espécie de resíduos industriais;

Considerando que a política do Governo em matéria de eliminação dos resíduos industriais perigosos está definida na Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/97, de 25 de Junho, onde se opta pela solução da co-incineração em unidades cimenteiras nacionais como forma preferencial de tratamento deste tipo de resíduos que não sejam susceptíveis de redução ou reciclagem.

Considerando que o Decreto-Lei nº273/98, de 2 de Setembro, estabeleceu as regras a que fica sujeita a incineração de resíduos perigosos por forma a prevenir ou reduzir ao mínimo os efeitos negativos no ambiente, bem como os riscos para a saúde pública;

Considerando que na sequência da Lei nº 20/99, de 15 de Abril, a Assembleia da República, por considerar não estar suficientemente esclarecida a propósito das vantagens emergentes da implementação do processo de co-incineração e da inexistência de riscos para a saúde pública decretou a suspensão da aplicação do Decreto-Lei nº 273/98, de 2 de Setembro, desde a sua entrada em vigor, no que respeita às operações de co-incineração de resíduos industriais perigosos, determinando a constituição de uma comissão científica independente para relatar e dar parecer relativamente ao tratamento deste tipo de resíduos;

Considerando que a Comissão Científica Independente, criada pelo Decreto-Lei nº 120/99, de 16 de Abril, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 149/99, de 3 de Setembro, recomendou a implementação do "processo de co-incineração em fornos de unidades cimenteiras por não implicar um acréscimo previsível de emissões nocivas para a saúde quando comparado com a utilização de combustíveis tradicionais, por ter menores impactos ambientais que as incineradoras dedicadas, contribuir para um decréscimo do efeito de estufa, conduzir a uma maior recuperação de energia, por não ter impactos ambientais acrescidos em relação aos da produção de cimento quando respeitando os limites fixados, por razões económicas mais favoráveis em termos de investimentos e de custos de operação, e por se revelar como uma solução mais flexível para a gestão dos RIP permitindo acompanhar melhor a evolução tecnológica".

Considerando que a Comissão recomendou, por outro lado, que o processo de co-incineração fosse implementado nas cimenteiras de Souselas (Coimbra) e do Outão (Setúbal);

Considerando que as Resoluções do Conselho de Ministros n.º 91/2000 e 92/2000, ambas publicadas em Diário da República de 20 de Julho de 2000, confirmam a opção pela co-incineração como método de tratamento de resíduos industriais perigosos cujo destino mais aceitável é a queima, acolhem a preferência manifestada pela Comissão Científica Independente pela localização do projecto de co-incineração nas unidades cimenteiras de Souselas (Coimbra) e Outão (Setúbal); declaram para todos os efeitos legais que os actos para a concretização deste projecto se revestem de relevante interesse público e que constitui grave lesão do interesse público qualquer acção ou omissão que prolongue ou agrave a actual situação;

Considerando que a Assembleia da República, através da Lei nº 22/2000, de 10 de Agosto, conferiu um novo mandato à Comissão Científica Independente, determinando a criação no seu seio de um grupo de trabalho médico para a elaboração de um relatório específico que "deverá pronunciar-se conclusivamente sobre se os riscos enunciados no capítulo V do parecer relativo ao tratamento de resíduos industriais perigosos, apresentado pela Comissão Científica Independente de Controlo e Fiscalização Ambiental da Co-incineração, são aceitáveis na óptica da saúde pública, tendo em conta o estado actual dos conhecimentos e os resultados das vigilâncias epidemiológicas realizadas noutros países em situações similares";

Considerando que este último relatório concluiu que "para efeito do n.º 4 do artigo 5.º da Lei n.º 22/2000, de 10 de Agosto, e uma vez asseguradas as condições anteriormente enunciadas, entende-se, tendo em conta o estado actual dos conhecimentos e os resultados de estudos realizados noutros países em condições similares, dar parecer positivo ao desenvolvimento das operações de co-incineração de resíduos industriais".

Considerando que a Assembleia da República prorrogou, nos termos da mesma lei, a suspensão do Decreto-Lei n.º 273/98, de 2 de Setembro, até ao momento em que o Governo deu conhecimento deste relatório à Assembleia da República, o que ocorreu em 15 de Dezembro de 2000;

Considerando que à luz dos aludidos relatórios da Comissão Científica Independente o Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, nos termos legalmente exigíveis, determinou a abertura de um período de 60 dias de discussão pública sobre as recomendações e conclusões dos relatórios da referida Comissão Científica;

Considerando que na sequência do período de discussão pública a Comissão Científica Independente concluiu que os factos e argumentos invocados e aduzidos pelos particulares e demais entidades interessadas no âmbito do período de discussão pública "não são susceptíveis de pôr em causa ou de afastar as conclusões e os argumentos técnicos e de natureza científica que presidiram à elaboração dos dois relatórios da CCI e do Grupo de Trabalho Médico, GTM, que decidiram ser a co-incineração em cimenteiras a metodologia mais apropriada para o tratamento de um grupo importante de Resíduos Industriais Perigosos";

Considerando que os argumentos invocados relativamente à localização no Outão não têm fundamento porquanto não resultará, da opção pela co-incineração nesta unidade cimenteira, um impacte ambiental acrescido para o habitat natural, a fauna e a flora do sítio do Parque da Arrábida, tendo em conta as regras e medidas cautelares preconizadas e recomendadas pela Comissão Científica Independente;

Considerando que o Senhor Presidente da República, em mensagem dirigida à Assembleia da República datada de 27 de Julho de 2000, fez questão de salientar que a Lei 22/2000, de 10 de Agosto – a quarta lei que, no período de pouco mais de um ano, a Assembleia da República aprovou sobre esta matéria, com o intuito de revogar, alterar ou suspender os três decretos-lei que no mesmo período foram aprovados pelo Governo – deverá ser entendida como "um último contributo para a decisão política do problema", devendo o relatório sobre o impacto dos processos de queima de resíduos industriais perigosos sobre a saúde pública – cuja elaboração a lei regula – "ser o último procedimento a anteceder as decisões políticas que urge tomar sobre o problema ambiental em apreço".

Considerando as consultas públicas já efectuadas no âmbito da avaliação de impacte ambiental e no âmbito do Parecer Relativo ao Tratamento de Resíduos Industriais Perigosos, bem como o aproveitamento de todos os actos já produzidos no âmbito do procedimento até agora suspenso, nomeadamente as Resoluções do Conselho de Ministros nºs 91/2000 e 92/2000, ambas de 20 de Julho;

Considerando a existência de uma Comissão Científica Independente que tem por missão a definição, acompanhamento e aferição de todos os aspectos relacionados com o sistema de monitorização ambiental da actividade de co-incineração.

Assim:

1º - Reitero, nos termos da Resolução do Conselho de Ministros n.º 92/2000, de 20 de Julho, a opção pela co-incineração como método de tratamento de resíduos industriais perigosos incineráveis que não sejam susceptíveis de redução ou reciclagem;

2º - Proponho para aprovação em Conselho de Ministros um projecto de Decreto-Lei que declare a cessação da suspensão da vigência das normas do Decreto-Lei nº 273/98, de 2 de Setembro, no que respeita às operações de co-incineração de resíduos industriais perigosos, incluindo a avaliação e selecção de locais para queima e tratamento desses resíduos;

3º - Confirmo as recomendações e conclusões dos relatórios da Comissão Científica Independente, designadamente a localização do projecto de co-incineração nas unidades cimenteiras de Souselas (Coimbra) e Outão (Setúbal), nos termos e com as limitações ali indicadas;

4º - Autorizo a prossecução do procedimento administrativo conducente à realização de uma fase de ensaios nas unidades cimenteiras, sob a supervisão da Comissão Científica Independente;

5º - Declaro, para todos os efeitos legais, que face à premência em tomar medidas que permitam resolver o grave problema ambiental consistente na actual ausência de tratamento adequado de uma parte importante dos resíduos industriais perigosos, o desenvolvimento e implementação do processo de co-incineração nas unidades cimenteiras nacionais e os actos em que os mesmos se concretizem, designadamente a fase de ensaios a realizar nas cimenteiras, se revestem de relevante interesse público;

6º - Reitero que prolongar ou atrasar, por qualquer meio, a implementação do processo de co-incineração de resíduos industriais perigosos constitui grave lesão do interesse público.

Gabinete do Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território, 9 de Abril de 2001

O Ministro do Ambiente e do Ordenamento do Território

 

José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa