Convenção de Estocolmo e Tratamento de Resíduos Industriais

 

Tem vindo a comunicação social a notificar variadas tomadas de posição contra a implementação da co-incineração em Portugal, hipoteticamente baseadas no facto do nosso país ter assinado a Convenção de Estocolmo sobre Poluentes Orgânicos Persistentes (POP), em Maio de 2001.

Face às numerosas incorrecções que têm vindo a ser veiculadas pelos órgãos de comunicação social, compete à Comissão Científica Independente (CCI) esclarecer o seguinte:

1. Os POP são substâncias orgânicas de grande estabilidade que se vão acumulando no meio ambiente. Mesmo que no seu ponto de emissão possam ter concentrações muito baixas, o efeito de acumulação e transmissão no ecossistema torna-as particularmente perigosas.

Estas substâncias químicas resultantes da actividade humana têm sido encontradas nas zonas mais remotas do planeta, tais como as regiões polares.

Dado que a problemática ambiental dos POP tem um caracter global, a Agência das Nações Unidas para o Ambiente (UNEP), conseguiu em Estocolmo fazer aprovar um conjunto de medidas que tendem a limitar ou eliminar estes produtos, garantindo que o seu uso é feito de forma criteriosa e controlada, assegurando sempre que para os mesmos estão previstos processos eficazes de lhes dar um destino final.

São exemplos dos produtos a eliminar (Anexo A) algumas substâncias utilizadas na agricultura, tais como insecticidas (Aldrin e Clordano), nas indústrias de produção de equipamentos eléctricos (PCB) ou como solventes (hexaclorobenzeno). O DDT, usado como insecticida aparece como substância a utilizar em situações restritas a empregar excepcionalmente no controlo de pragas. Finalmente, no Anexo C da Convenção referem-se produtos que não são produzidos intencionalmente, antes resultam de actividades industriais diversas, como é o caso das dioxinas e furanos.

2. Qual a origem potencial das dioxinas e furanos? O Anexo C identifica 20 fontes, desde os motores dos veículos automóveis, às combustões domésticas, combustões ao ar livre, caldeiras industriais, indústrias do papel, do aço, e outras indústrias metalúrgicas, bem como actividades menos frequentes como as praticadas em crematórios, queima de carcaças animais, ou indústria de refinação de óleos usados, que ainda não existe em Portugal.

Estão também indicadas como fontes potenciais as incineradoras de resíduos incluindo a co-incineração de resíduos municipais, resíduos perigosos e incineradoras hospitalares.

No caso da co-incineração a introdução de resíduos nas torres de pré-calcinação ou carregamento massivo dentro de tambores, são práticas incorrectas que podem potenciar as emissões, não só de POP, como de outros produtos orgânicos mal queimados.

Ao contrário do que algumas leituras tendenciosas têm pretendido, em nenhum lugar se pode ler que estas actividades devem ser extintas, mas sim que é necessário tomar providências para minimizar ou mesmo eliminar a emissão dos POP (artigo 5 da Convenção de Estocolmo).Aliás as considerações deste artigo são extensíveis a toda a lista de actividades do anexo C, o que significa que se fosse preconizada a extinção da co-incineração, como se tem pretendido, estava-se igualmente a preconizar a extinção dos motores de automóvel, a extinção das indústrias metalúrgicas e do papel e mesmo o aquecimento doméstico em lareiras!

3. Para evitar ou minimizar a emissão de POP são recomendadas uma série de medidas, a implementar nas novas instalações industriais. Essencialmente pretende-se diminuir a produção de resíduos, evitar o uso de substâncias perigosas, promover a reutilização e a reciclagem, melhorar as condições de tratamento dos resíduos, acabando com as queimas incontroladas ao ar livre, como aliás a CCI quis evidenciar com o polémico exemplo da queima de madeira tratada, em lareiras (1º Relatório, Anexo 2).

Para além das medidas anteriores recomenda-se que a todo o momento se utilizem "as melhores técnicas disponíveis" para prevenir e reduzir ao mínimo os riscos ambientais.

Ora justamente esta estratégia tem vindo a ser seguida pela CE, que na sua Directiva 76/CE/2000 de 4 de Dezembro, relativa à incineração de resíduos, considera que a incineração e a co-incineração feita nas melhores condições se insere nos objectivos do 5º Programa de Acção da CE para reduzir em 90% até ao ano 2005 a emissão de dioxinas e furanos, relativamente aos níveis de 1985.

Basta comparar o texto da Directiva da CE em que se impõe limites para as emissões, com o texto da Comissão de Estocolmo, para se verificar que a legislação europeia é muito mais exigente e restritiva. Os problemas que os países do 3º mundo teriam para respeitar as normas europeias, obrigaram a uma redacção final muito mais vaga, constituida essencialmente por recomendações de carácter geral.

4. Ao propor algumas restrições significativas ao uso da co-incineração de resíduos industriais perigosos, nomeadamente a obrigatoriedade de introduzir os resíduos finamente divididos no queimador principal, ao impor limites de composição à entrada do forno, controlo analítico obrigatório na entrega dos resíduos e implementação de uma malha apertada de monitorização ambiental e de vigilância de saúde, não se limitando, portanto, à definição rígida dos limites de emissão, a CCI antecipou a implementação das recomendações da Convenção de Estocolmo, avançando para o uso das "melhores técnicas disponíveis", muito para além do exigido pela legislação americana e mesmo na nova directiva europeia, (ainda não transcrita para o direito português).

5. Cumpre à CCI chamar a atenção da opinião pública que a co-incineração, quando praticada com os cuidados que vão ser impostos, constitui um instrumento poderoso no combate à disseminação dos POP no Ambiente, ao contrário do que tem sido veiculado.

Se a co-incineração ou a incineração dedicada fossem banidas dos países industrializados, então a disseminação dos POP, por deposição ou resultantes de processos descontrolados de destruição, seria certamente um problema com tendência para se agravar, visto que não existem processos para eliminar estas substancias, para além das tecnologias térmicas de alta temperatura.

O uso das "melhores técnicas disponíveis", nas várias vertentes (controlo de emissões dos motores, dos fornos e equipamentos térmicos, nos sistemas de incineração de resíduos urbanos e industriais) tem já conseguido êxitos assinaláveis, nomeadamente no abaixamento nos últimos anos dos teores de dioxinas na cadeia alimentar europeia.

6. Face ao exposto a CCI encara com grande satisfação a assinatura por parte de Portugal da Convenção de Estocolmo, o que permitirá reforçar algumas das medidas preconizadas pela Comissão.

A ratificação da referida Convenção reveste-se pois de grande importância como forma de garantir uma estratégia globalmente correcta de tratamento dos POP, que transcende o quadro local ou regional, para cada vez mais ser uma questão vital para o planeta Terra.

CCI - Comissão Científica Independente

5 de Setembro de 2001


A Convenção de Estocolmo pretende alargar a todo o mundo um conjunto de medidas cautelares para evitar a disseminação de Produtos Orgânicos Persistentes (POP) que de forma mais especifica já se encontram contemplados pelas legislações da CE e dos EUA onde se impõe valores limites para as emissões.

As medidas cautelares para impedir ou minimizar as emissões de POP produzidas por várias actividades humanas, e entre elas a co-incineração, encontram-se referidas nomeadamente no artigo 5 e no anexo C.

Como se pode verificar o articulado da Convenção de Estocolmo em relação à co-incineração é muito menos exigente do que a Directiva 76/CE/2000.

Documento: Convenção de Estocolmo
 
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No documento "Standardized Toolkit for Identification and Quantification of Dioxin and Furan Releases" a UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME - UNEP indica formas de estimar a importância de diferentes fontes de emissão de dioxinas e furanos.

Documento: Standardized Toolkit for Identification and Quantification of Dioxin and Furan Releases - UNEP
Folha de cálculo de factores de emissão

Nota: se não possui o Adobe Acrobat Reader (para visualização de ficheiros com formato .pdf), poderá fazer o download aqui (programa gratuito)